O renascimento da escrita

Quem acompanha a jornada da minha escrita aqui no blog, viu no meu texto “Sementinha de escritora” o surgimento dessa vocação na infância. Lá compartilhei as fotos dos meus primeiros romances escritos, ilustrados e editados pelo meu eu de seis anos. E também um texto muito especial de quando arrisquei me embrenhar pela poesia na pré-adolescência.

No texto “A essência do escritor” mostrei como o período em que a escrita ficou adormecida foi essencial para o desenvolvimento da minha identidade como escritora. Pois foi durante esses anos que me tornei efetivamente uma leitora e tive contato com as obras que me influenciaram e inspiraram.

Agora chegou o momento de mostrar como a escrita foi despertada novamente. Como ela emergiu das profundezas do meu inconsciente e voltou a fazer parte da minha identidade.

Reencontro com a escrita

Em 2009 me mudei para São Paulo. Dispensando apresentações, mesmo quem não conhece já deve ter ouvido falar das proporções monstruosas da maior cidade do país, e uma das maiores do mundo. Também não é segredo que a vida na capital é uma loucura, a correria é infinita e o trânsito é eterno.

E provavelmente foi no trânsito em que passei grande parte das horas da minha existência durante os 10 anos que residi na cidade. Além de torturante e angustiante, essas horas infinitas paradas no lugar eram muito tediosas. Não havia música ou programa de rádio que desse conta. Porém, mal sabia eu que o tédio é o maior combustível para a criatividade. O ócio criativo. Já ouviu falar?

Acredito que só sobrevivi a esses momentos sem enlouquecer graças a minha imaginação que ganhava asas e viajava para os lugares e ocasiões mais inusitadas. Lembrava de situações vividas, achava soluções para problemas e imaginava cenas e histórias que gostaria de experimentar.

E foi quando surgiu a minha personagem. Um dia, presa em uma fila enorme de carros, sob a chuva do fim de tarde, ela simplesmente brotou na minha mente. E se existisse uma garota capaz disso, isso e isso? O que será que aconteceria? Mas o trânsito andou, a ideia se dispersou, e a vida seguiu.

Em várias ocasiões engarrafadas, a personagem voltava a me visitar. Aos poucos fui visualizando como ela seria fisicamente, quais seriam seus princípios, seus gostos. E ela foi ganhando forma. Eu não tinha uma história em mente, apenas alguém diferente que queria implantar nesse mundo e ver o que poderia acontecer.

No final de 2013 tomei uma decisão que mudaria para sempre a minha vida: eu queria ser mãe. E essa passou a ser minha maior meta, meu mais profundo desejo. Uma verdadeira necessidade. Então, 2014 foi um ano regido por calendários menstruais, testes de farmácia e tentativas frustradas.

O ano avançava e o positivo não acontecia. Então, comecei a me deprimir. No início tentava encarar com naturalidade e me convencer de que tudo estava dentro da normalidade. Mas depois do sexto mês comecei a ficar realmente preocupada.

A frustração tomou conta dos meus dias, as cores se apagaram e me vi sem nenhum outro objetivo de vida. Sem um filho, nada mais faria sentido. Para quê construir alguma coisa se não existisse alguém para recebê-la?

E foi em um dos dias mais angustiantes desse processo que um lampejo de sobriedade acertou a minha mente: eu precisava de algum outro objetivo. Não podia me afundar dessa maneira por uma situação que estava completamente fora do meu controle. Que não dependia de mim. E foi numa madrugada, entre lágrimas com sabor de derrota, que decidi: vou escrever um livro!

Imediatamente minha personagem apareceu em minha mente, e no dia seguinte, liguei o computador e escrevi. Escrevi, escrevi e escrevi. Sem planejamento, sem estudo prévio. Simplesmente despejei uma história que estava engasgada dentro de mim e precisava ser contada (e que não tinha nenhuma relação com o momento que estava passando).

Depois de algumas semanas, e muitas páginas, comecei a sentir a necessidade de mostrar para alguém. Precisava que alguém lesse, opinasse, dividisse aquilo comigo. Com muita insegurança e timidez, conversei com quatro amigas e confessei o que estava fazendo. Eram pessoas com gostos literários bem variados, uma inclusive nem era leitora. Mas todas toparam na hora ler o que eu tinha escrito.

Comecei a mandar os capítulos conforme ia finalizando-os. E para minha surpresa, elas adoraram! Discutiam a história entre si, pediam spoilers, me cobravam quando eu demorava para mandar mais páginas. Eu sei que a opinião de amigas é suspeita, mas elas foram todo o incentivo que eu precisava.

Então eu mergulhei de cabeça nesse novo projeto. As personagens ganharam vida própria bem na minha frente e iam conduzindo o curso da história sozinhas. As cenas mais importantes apareciam quando eu escrevia, sem planejamento prévio. Até eu me surpreendia.

E quanto escrevia, parecia sair de mim. Não estava mais digitando na frente do computador. Era transportada para dentro da minha própria história. Me sentia leve, em êxtase. Foi libertador!

Ao final de quatro meses eu tinha um romance de mais de 400 páginas em mãos, um clube de leitoras, e uma satisfação que jamais tinha experimentado na vida! Algo adormecido fora despertado com todas as forças e não seria contido novamente.

Ah! Adivinhem o que aconteceu quando terminei de escrever o livro? Eu engravidei!

“Não há agonia pior que carregar uma história não contada dentro de você.”

Maya Angelou

2 comentários em “O renascimento da escrita

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  1. Algumas pessoas criativas, como Arquimedes, tem as melhores ideias durante o banho. Outras, mais modernas, quando presas num congestionamento.
    Quando as ideias querem aflorar elas dão sempre um jeito de nos pegarem distraidos.

    Curtido por 1 pessoa

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